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Moscou, Rússia - O motorista "polvo".

(63º dia viajando)

 

 

Moscou, Rússia, 26 de abril de 2013

 

     Hoje vamos falar apenas de uma pequena experiência nossa aqui na Rússia, quando me vi perdido entre voos internacionais e conexões em outro país.

 

         Acabei de voltar pra casa (Moscou) depois de um dia corrido, o relógio marcando quase meia-noite: eu tinha dado um pulinho num país aqui do lado (Turquia) e quase não volto.

        Meu dia começou cedo, às 0230 da ‘madruga’ (preferi emendar, não dormi de ontem pra hoje). Embarquei num táxi em direção ao aeroporto internacional de Moscou, o Vnukovo, (um dos 3 que existem na cidade).

 

        O motorista era um camarada bem “raro”: assim que começou a rodar, transformou-se num polvo!

 

     O cara era “multitarefa”, pois conseguia dirigir com a mão esquerda e com as outras 7  mãos e braços, enviava e respondia mensagem no seu celular, navegava na internet, se localizava no GPS (se ele não sabia onde estava, imagina eu!!!???),  além é claro, de fazer e receber ligações no celular e passar as marchas do carro.

 

       Enquanto ele fazia malabarismos ali dentro, as coisas iam acontecendo do lado de fora – semárofo abrindo e fechando, “homens trabalhando na pista”, etc., mas quando ele quase atropelou um bêbado, pensei que as coisas iam melhorar, porém ele deu uma gargalhada, olhou pra mim, fez um comentário (deve ter dito: bêbado filho da P. !!!) e continuou dirigindo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(foto do nosso motorista)

 

         Olhei pro banco de trás (sim, eu não estava sozinho) e pra piorar, o outro passageiro e motivo desta aventura de hoje era minha mãe, de 81 anos, que eu estava levando para embarcar de volta para o Brasil – achei que a boa velhinha estava tirando um cochilo, mas ela me lembrou um camaleão com aqueles grandes olhos abertos e mudando de cor a cada curva que o pneu “cantava” – o “polvo” tinha pé de chumbo, pra piorar.


         Agora quem vai xingar sou eu, me desculpem: PQP!!! (me imaginem gritando, por favor).

  
         Eu era o próprio Garfield, o gato gordo que fica agarrado nos pára-brisas com aquela cara de espantado – só não fiquei grudado no vidro porque o cinto de segurança não deixava.


         Depois de 40 minutos - me desculpem outra vez, mas eu estava literalmente com o C#*& na mão - e de tão apertado, como diz um amigo meu, não passava nem um átomo ensaboado de hidrogênio – enfim, nós conseguimos chegar no aeroporto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                       (essas cabines são para assistir filmes que vc aluga, enquanto espera o voo)

 

 

           Por sinal, abrimos o aeroporto. Foi a impressão que tive. Faltou somente levantar a porta de ferro e dar bom dia para o guarda.

           Motivo de estar ali às 03:10hs da madruga? Ia decolar com minha mãe para Istambul, capital da Turquia  e não era pra encontrar a Morena e nem a Delegada da novela das 9, a tal de “Salve Jorge” – mas eu bem que procurei...

           Para os amigos do quartel que vão me sacanear, informo que não acompanho tal novela que nem o nome sei direito – quando mudo de canal entre uma luta do UFC e o futebol, o desgraçado do controle remoto passa pela Globo e nos poucos milissegundos que as imagens pipocam na tela, minha super-mente treinada consegue captar todo o enredo do que tá rolando, levo um susto com as baboseiras que vejo, deixo a cerveja cair do copo, faço sinal da cruz e volto pro UFC – pois bem, depois de abrir os trabalhos no estacionamento de aviões de Moscou, embarcamos para Istambul/Turquia, que fica a 2 horas de voo dali.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(máquina de fazer "dog tag", plaquetinha estilo militar de identificação, no aeroporto)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(chek-in vazio do aeroporto de Moscow)

 

 

         O avião da Turkish Airlines (recomendo) decolou somente as 0600 para pousarmos às 0800 na cidade de São Jorge (ops! ato falho), digo, Istambul.

        Outro momento tenso: minha missão secreta em Istambul/Turquia seria embarcar D. Iracema de 81 anos, guerreira, que já criou seus 3 filhos e já tem 7 netos, num avião também da Turkish (conexão dela, saindo de Moscou, para o Brasil) e depois, retornar em segurança para Moscou, pois Emili e Pedrinho ficaram me esperando no hotel.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                                                   (aeroporto turco - Istambul)

 

 

 

         Mas tinha um problema técnico a enfrentar no meio do caminho: ela ia para uma conexão imediata e eu, para um novo voo de volta à Rússia, decolando na parte da tarde. Teria que pedir uma autorização para que eu a acompanhasse até a área de embarque internacional, cheia de gente do mundo todo e vários duty-free lotados.

 

         Podiam pensar que eu queria “muambar” ali? Iam colocar areia nos meus planos? Mas o nosso santo foi forte nessa hora (ainda o São Jorge?) e repetindo mentalmente meu mantra espiritual aprendido no Tibet, enquanto a longa fila da “conexão” andava (“força na peruca”, “força na peruca”, “força na...), fomos salvos quando, ao me deparar com a “russa conferidora da passagens aéreas” para entrar na área sagrada das conexões internacionais e que possivelmente não ia me deixar entrar – um segurança do aeroporto entrou na minha frente pra falar com ela e aproveitando a pequena confusão, mostrei a passagem da minha santa mãezinha e entramos os dois ao mesmo tempo. A russa nem notou que mostrei apenas uma passagem...


         Nessa hora pensei numa coisa: entrar foi fácil, mas como é que eu vou sair daqui depois de cumprir a missão? tô ferrado... contudo, a missão tinha que ser cumprida e faltava agora colocar D. Iracema dentro do “busão pra sampa” – ia descer em Guarulhos.


         No mais, tinha um paraquedas na minha mochilinha, além dos apetrechos de guerra/sobrevivência que sempre levo para a Turquia – ia ser moleza.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                        (eu devia ter passado por aqui no aeroporto da Turquia, mas dei o golpe)

 

 

         Lágrimas escorreram quando vi minha mãe dobrando a curvinha do acesso ao avião, aquele tubo que encaixa no bichão e você escorrega pra dentro – por aquela senhora, valeria até ficar preso em Istambul e ... ops! acordei do sonho para entrar no pesadelo! Tinha que voltar para Moscou com as microfilmagens/fotos do templo sagrado do consumo turco e com todas as informações necessárias para o “vale a pena ver de novo” da Globo ano que vem (reprise da novela do São Jorge), e deixar tudo no Kremlin amanhã de manhã!


         Elaborei um plano de fuga para escapar da área de embarque/dutyfree turca sem levantar suspeitas e com o meu inglês “econômico”, minha primeira providência foi... ir ao banheiro (para os militares=deu uma RVC). Missão parcialmente cumprida, dei continuidade ao meu plano e procurei uma funcionária da Turkish Airlines para pedir ajuda, tentando explicar como tudo começou.


         Achei interessante contar a história do taxista também, pra comovê-la, o que deu certo pois nem eu mesmo entendia o que eu falava e ela foi ficando tão confusa e tímida por não entender P.N. que imprimiu minha passagem o mais rápido possível para ser ver livre de mim, dizendo boa viagem! E me  deixou ficar por ali mesmo.

         Puxa, deu certo, iria entrar num avião de volta pra Rússia e sem carimbo turco algum no passaporte – mas pensei também: isso vai dar M. lá na frente, quer ver? Chequei meu paraquedas pronto para correr, quebrar o imenso vidro daquele 2º andar e abrir no estilo bung-jump, fugindo dos policiais entre as mesquitas. Minha super-mente sempre um passo à frente dos turcos...

        Pois a moça da passagem estava certa e foi uma excelente viagem.

        É claro que antes, fiquei conhecendo todo o aeroporto da Turquia, pois peguei o cartão de embarque lá pelas 1030hs e decolei somente às 1530hs – com isto, descobri várias/novas posições de cochilar/dormi em cadeiras de aeroporto, vi todas as marcas de perfumes/chocolates imagináveis, comi um burguer-king, vi dois caras escorregando na escada rolante e ninguém riu (só eu, mas discretamente), um segurança correndo (quase que corro junto com ele, vai saber), 5 mulheres com burcas (estilo ‘full’, apenas o branco dos olhos aparecendo), o clone do Ziá  (quase peço um autógrafo – ops! tive uma recaída) – mas nada de Morena nem Delegada.


        Embarquei, cheguei em Moscou, desci do avião e me lembrei que tinha que passar pelo pente-fino da KGB outra vez, para entrar no país e... como eu ia explicar que tinha saído de Moscou naquela madrugada (ia omitir o taxista-polvo desta vez), tinha entrado na Turquia e estava voltando sem carimbo algum no passaporte? Pra onde eu fui realmente? Com quem? Encontrar quem? Fazer o quê? Pegar o quê? Entregar o quê? O que estava dentro daquela mochila que eu não soltava? Por que minhas mãos estavam suando tanto? Por que eu estava com olhos tão vermelhos? Parecia que eu nem tinha dormido direito – você dormiu, cidadão? Ou está fazendo uso de “tóchico”?


         A fila ia andando e minha vez se aproximando para a conferência do passaporte. Ali é “phoda” e para contribuir com a tensão, o ambiente ainda é todo metálico (tudo em aço inox) e o cara fica do lado de dentro de um vidro, que tem a altura gravada nele para o policial ter ideia do seu tamanho, tem uma “porteirinha” que abre quando a luz vermelha apaga, uma “porta de bar” que sobe/desce e várias câmeras de segurança – é, nada escapa ao meu olhar treinado, mas nesta hora não via uma vidraça gigante para eu quebrar e sair voando com meu paraquedas naquela manobra exaustivamente treinada que não usei em Istambul. Como fugir dali?

        Acordei quando o policial perguntou: “Istambul?”

        Entendi que ele queria saber de onde eu estava chegando, apesar de todos ali terem saído de dentro do mesmo voo da Rede Globo e respondi: “sim, Istambul”

Péééééééé – resposta errada! KGB, digo, KCT! Na verdade, ele tinha perguntado se eu era “turco”!!! E eu respondi que sim!!! Ele pega um telefone vermelho (vermelho? Fudeu!), e enquanto olha fixo nos meus olhos digita várias coisas no computador e sem largar o fone, me pergunta: “cadê a porra do seu visto???” Nesse momento, eu mantralizava mentalmente “força na peruca, Luiz”, “força na peruca, Luiz”, AOMMMMMM... mas meu cérebro parou de funcionar normalmente e aconteceu o pior: tropecei nas palavras, gaguejei... e em inglês! Para quem entrevista, sabe que este é o maior sinal de “insegurança” e nervosismo que o entrevistado pode demonstrar.


            Pensei colocar em ação todo os meus 30 anos de treinamentos exaustivos no Exército (lutas, tiros, treinamento físico constante, entre outras coisas pesadas e cansativas - pois a tormenta, insegurança e inquietação eram meus lemas) e confeso que também pensei em ... me ajoelhar, colocar as mãos pra trás e dizer: “eu me rendo”.


            Mas novamente aquele velho ditado militar mostrou-se verdadeiro: me veio na mente a imagem do guru, o militar das antigas, um verdadeiro mestre “jedai” me olhando profundo e dizendo as sábias palavras, no meio de um campo de batalha, quando a guerra parecia perdida “quando o cú aperta, a mente abre, meu filho”!


            Foi o que me salvou e antes que ele me enviasse para trabalhos forçados na Sibéria, eu disse (murmurei, acho) “sou brasileiro, Brasil, sim? Brasil não precisa de visto pra nada! Você me entende? Brasil!”


            Não vou esquecer a expressão do rosto do policial – ele falou “algo-parecido-com-brasil-em-russo” no telefone e alguém deve ter dito: “brasileiro? Ahhh, então deixa esse mané entrar, tá tranquilo!”.


            Pois ele desligou o fone, sorriu e falou “turista? “e eu quase surrurei, balbuciei (estava esgotado pelo dia de provações): “sim, my friend”  ...“I’m a tourist” ... e a tal luz verde acendeu e outras luzes coloridas também, e todos aplaudiram, caíram balões do teto, veio o Presidente russo e me entregou flores e uma faixa e eu entrei novamente em Moscou, sem ter sido molestado sexualmente, com alguns rublos a menos, sem minha mãezinha do lado (que saudade) e pronto para voltar pra Emili e Pedrinho, que deviam estar aflitos. Eu estava sem fone e sem internet, tinha dado um pulinho em outro país e estava voltando agora pra Rússia – mas como chegar até eles?


            Peguei um trem confortável, por 320 rublos (um real=15 rublos), que sai de todos os aeroportos da cidade e vai até  o sistema de metrô, viagem de 35 minutos.

 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                         (trem expresso que sai dos aeroportos direto para o sistema de metrô - não vá de táxi!!!)

 

       No metrô, que custa 28 rublos o cartão (aqui é cartão, diferente da moedinha de St. Peters), não fiz baldeação e foi só seguir o mapa, que é facílimo de entender e bem explicadinho. Olha a teia de aranha do sistema do metrô, os caras são phoda mesmo. Onde tem 3 pontinhos juntos é que as linhas se encontram por ali, em níveis diferentes de profundidade, ou seja, você sobe ou desce as escadas rolantes para mudar de linha/estação.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


            Depois de ler bastante o mapa do metrô e entender as letras do alfabeto russo, fiz as analogias com palavras conhecidas: estação CAPUTINO, estação SEM AS PERNAS, estação MEU OUTUBRO e por aí vai, deu certo em St. Peterburgo e deu certo pra mim agora.   Cheguei em casa são e salvo, quase meia noite, com Emili e Pedrinho pulando nos meus braços, a família de mochila junta outra vez.


 
            Quase dois dias sem dormir, mas a missão foi cumprida: D.Iracema seguiu para Sampa e depois, Belo-Horizonte, sem problemas.  Amo minha mãe.

 

 


Abraços a todos.

Família de Mochila

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